Superando o LUTO

David Zumerkorn

31/07/2022 - 01:37

Superando o Luto

Homenageie um ente querido

Para a elevação da alma de Yaacov Leibi  ben Zyndel ZייL – ל”נ יעקב לייב בן זינדעל ז”ל

SUPERANDO O LUTO

Embora o fato de que todos morrerão seja uma certeza universal, a forma como entendemos e respondemos à morte é moldada por forças históricas, culturais, políticas, econômicas e, claro, religiosas.

Normas, valores e práticas compartilhados orientam nossas expectativas de como os enlutados devem se comportar, de como nos relacionamos com a perda, das responsabilidades da comunidade e das identidades sociais dos mortos.

O luto acontece com todos, o que varia é a intensidade com que os sentimentos são vivenciados. Para alguns, o tempo de luto parece eterno, para outros, é apenas mais uma fase da vida que o tempo irá resolver.

A maneira como pensamos sobre a morte é influenciada por nossa herança judaica.

O rei Salomão disse: “Ninguém morre com metade dos desejos de seu coração satisfeitos” (Midrash em Eclesiastes [Kohelet] 1;13). Isso significa que todos nós estamos sofrendo nossas próprias perdas particulares.

Imagino que tenhamos uma “caixa” no coração onde colocamos nossos próprios sonhos não realizados e nossas lembranças.  Quanto maior a perda, com mais dificuldade devemos lutar em duas frentes: a) para nos mantermos fisicamente funcionais e b) para fortalecer nossa fé.

O processo de luto é particular a cada um, mesmo com outras pessoas envolvidas na mesma dor. Isso porque cada um tem a sua própria maneira de interpretar esse vazio e a dor, desde o momento de um choro até os dias que irão se seguir.

O luto é um momento de mudança, uma transição normal e esperada do ciclo de vida. Ao invés de algo para se recuperar, o luto é um processo de acomodação; não é um processo linear através de um conjunto fixo de estágios, mas um movimento helicoidal de negociação de uma série de crises e acomodações.

O luto é um processo contínuo de renegociação de um relacionamento, um “vínculo contínuo”, com alguém que não está mais conosco presente fisicamente, e de reconstruir um mundo significativo e nosso lugar nele, após uma perda. Este é um processo não de abandonar um apego ou de desistir do passado, mas de mudar nosso relacionamento com ele. O luto é um processo ao longo da vida, pois o relacionamento com o falecido e o significado da perda são continuamente revisitados e renegociados à medida que os eventos da vida ocorrem.

Qualquer perda causa uma anulação temporária de equilíbrio – físico, emocional e espiritual.

Talvez a coisa mais difícil sobre o luto, seja que não temos ideia de que ele vai atacar ou quanto tempo vai durar.

Para muitos, o corpo não quer se mover. Momentos de aceitação são intercalados com emoções que vão da apatia à descrença de que o fato ocorreu. Atos que fazíamos tão espontaneamente, desde escovar os dentes até preparar uma refeição, de repente exigem um esforço enorme.

As palavras da oração, que uma vez nos tocaram tão profundamente, podem para alguns de repente parecer vazias e sem sentido. Podemos nos sentir como se toda a vitalidade tivesse sido drenada de nossos corpos. Nos perguntamos quando vamos “voltar ao normal“, sem perceber que “normal” agora terá uma nova definição e que leva tempo para se ajustar a conviver com a dor.

Este processo não pode ser forçado. As pessoas muitas vezes se perguntam: “Por que não posso simplesmente voltar ao meu antigo eu?” Mas não é isso que D-us quer. Ele quer que usemos a dor para desenvolver um nível mais profundo de fé e obter entendimentos que não possuíamos antes. Devemos nos permitir sentir a dor em toda a sua intensidade e, ao mesmo tempo, honrar nossas novas forças. Caso contrário, é provável que queiramos abafar a dor com pílulas para amortecer as emoções ou nos envolver em outras formas de escapismo, que com certeza, o tempo nos mostrará que é um erro!

Uma das razões pelas quais esse período de adaptação leva tempo se deve ao fato de que, quando o sistema nervoso sofre um choque, nos disseram que o corpo é inundado por hormônios do estresse, como cortisol e adrenalina. Esses hormônios destroem células em uma área específica do cérebro que controla a memória e o foco. Leva dois anos para essas células se regenerarem após um choque muito grave, como uma morte súbita, ou outra grande perda.

Pense: Não posso desfazer os atos de D-us. Não posso desfazer a perda de vidas. Mas posso responder a isso sendo mais humano e voltado ao Divino. Posso abrir meu coração para a dor e a perda. Posso permitir que meu coração se parta com o conhecimento de que ele se curará e crescerá. E ao fazer isso, posso me aproximar da alma que nos une um ao outro, mais perto de D-us e ao nosso povo.

Existe o luto curto “longo”, e o luto longo, porém curto. No luto curto “longo”, a pessoa se esquiva, e tenta fugir de tudo que esteja relacionado ao luto, inclusive das obrigações religiosas, como forma de esquecer rápido a dor. Porém com esse comportamento a ferida do luto dificilmente irá se cicatrizar, e irá “acompanhar” essa pessoa por muito e muito tempo, diferentemente do luto longo, porém curto, quando se seguem todas as orientações religiosas, e encontra a paz no final do processo!

Apesar de ser muito difícil para algumas pessoas, devemos aprender a lidar com uma saudade eterna. Nós devemos tentar viver agora em um mundo onde algo ou alguém que amamos está faltando e abraçar as possibilidades que o futuro tem a oferecer.

Quando os sábios judeus instituíram os rituais de luto judaicos encorajam os enlutados a se retirar temporariamente do funcionamento normal (sete dias [Shivá], trinta dias [Shloshim] e um ano [Yohrzeit]), e aceitar gradualmente a realidade da perda, mobilizar apoio social (de parentes e amigos) e encontrar um novo significado dentro das estruturas existentes que orientam suas vidas. Em particular, há a recitação diária da oração do Kadish, a inauguração da Matzeivá, e a marcação anual do aniversário de falecimento, que servem como um reconhecimento de que as memórias dos mortos estarão sempre conosco. Esses rituais reconhecem que a morte termina uma vida física, mas não um relacionamento espiritual com nosso ente querido que se foi.

A título de curiosidade, a palavra luto em hebraico é אֲבֵלוּת (Avelut), cujo valor numérico é 439 (1+2+ 30 +6+400), que também é o mesmo valor numérico das frases abaixo:

ישועה דגולה (Yeshuá Gue dolá) “Uma grande salvação” e

כמקור החיים (Ki Mekor Hahaim) “Como uma fonte de Vida

Isto significa, que a após o enlutado cumprir todas as orientações com relação ao luto אֲבֵלוּת (Avelut), indicadas pelos nossos sábios, a alma do ente querido que se foi, chegará a um nível cada vez mais elevado diante de D-us, e poderá interceder em nosso favor perante Ele, para nos trazer uma grande salvação e que sua abençoada lembrança, será como uma fonte de vida eterna para aqueles que ficaram.

Ensinam nossos sábios, que após a revelação de Mashiah (Messias), o ungido de Israel, haverá a ressureição dos mortos, e voltaremos a conviver com aqueles entes queridos que se foram.

O Zohar ensina que a Ressurreição começará quarenta anos após o retorno de todos os judeus à Terra Santa, e continuará intermitentemente até que todos voltem à vida. De acordo com o Talmude, os que foram enterrados na Terra Santa serão revividos primeiro e em seguida os que estiverem em outros países e locais. No Zohar está escrito que os Justos (tsadikim) e os que estudam a Torá serão os primeiros. O importante, entretanto, é que todos serão ressuscitados eventualmente, mais cedo ou mais tarde, para uma vida eterna.

Mesmo que difícil, deve-se continuar a vida, superar o luto e voltar à luta e jamais se esquecer daqueles que se foram.

Que o luto – אֲבֵלוּת (Avelut), não seja mais para nós, mas para aqueles que estão vivenciando hoje essa dor, que o Altíssimo possa lhes fortalecer e trazer a paz que tanto necessitam. Amén VeAmén.

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2 Comentários

  1. Eduardo Saverun

    Muito bom. Parabéns pelos excelentes artigos

    Responder
    • David Zumerkorn

      Muito obrigado Eduardo pelo apoio. Tudo de bom!

      Responder

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